Neste
momento, Centeio está empenhado numa produção de
Bollywood, e na índia tudo é feito em grande escala
precisa de coordenar uma equipa de seiscentas (600)
pessoas. Uma autêntica dor de cabeça para quem tem de
marcar estadias, refeições e prever os mais pequenos
detalhes. A vida de produtor não é fácil, «exige muito
trabalho, muita obstinação, e muito tempo».
Aconteceu na passada quarta-feira, dia 10 de abril, mais um
«Conversas com…» na biblioteca da Escola Secundária de
Casquilhos, projeto idealizado pela professora de filosofia
Maria Emília Santos.
No seguimento das “Conversas com…” a atriz e realizadora Ana
Rocha e a jornalista e escritora Alice Vieira, a terceira
conversa teve como convidado Fernando Centeio. Produtor com
mais de 30 anos de cinema e televisão, além de professor na
Universidade Lusófona, Centeio é um nome bem conhecido do
meio audiovisual português e não só. Iniciou a sua carreira
como assistente de realização de Belle Époque, comédia
dirigida por Fernando Trueba e vencedora do Óscar de Melhor
Filme Estrangeiro em 1992. Mais tarde, enveredou pela
produção e distribuição, tendo feito acontecer dezenas de
projetos, tais como Tapete Voador (2008), Sombras da
Majestade (2015) e Vieirarpad (2021), de João Mário Grilo, a
série Puro Fado (2021), de Paulo Valentim, e o documentário
de ficção Gesto (2011), de António Borges Coelho.
Este último foi visualizado no auditório pelos alunos da
Escola Secundária de Casquilhos, na terça-feira dia 9, no
âmbito da disciplina de Educação para a Cidadania e como
forma de preparar a receção do convidado, no dia seguinte.
Assim, a escolha do filme Gesto (2011) teve em conta a
temática da inclusão e o facto de o argumento do mesmo ter
sido escrito por um dos professores estagiários da Escola
Secundária de Casquilhos, integrado no Mestrado em Ensino de
Filosofia no Ensino Secundário, da Universidade Nova de
Lisboa.
Galardoado com 1º Prémio da Gala da Inclusão 2012, atribuído
pelo Instituto Politécnico (IPL) e o Município de Leiria,
Gesto é um documentário de ficção que retrata a história de
um jovem de 18 anos que sofre de surdez profunda. Apesar das
suas limitações auditivas, António quer estudar cinema no
estrangeiro e ser um realizador de cinema. Este seu sonho
desafia o seu destino e as suas impossibilidades, provocando
perplexão em Irina, a sua namorada, também surda. O
espectador é, pois, convidado a entrar neste mundo
silencioso de António, cheio de crises existenciais que
fazem afinal lembrar as crises de qualquer um de nós,
sejamos surdos, cegos, ou consigamos ouvir e ver os
coloridos da vida. Por falar em cores, o filme é realizado
propositadamente por uma palete monocromática, para que,
congénere com a insensibilidade auditiva de António, o
espectador se sinta insensível à cor. Só assim, o espectador
pode intimamente compreender o mundo de António e o
significado dos seus «gestos».
Conscientes desta realidade os alunos puderam, então, ter
uma conversa frutífera com o produtor. Centeio, conta ele,
que estudava para ser piloto de helicópteros, quis voar
ainda mais alto. Largou o rigor da Força Aérea para poder
criar mundos e dá-los a conhecer a todos. «Ia levando com um
pau dos meus pais», diz Centeio para a biblioteca que se ri.
Compara, não obstante, a disciplina da sua formação militar
com o trabalho que assiste a um produtor cinematográfico. Um
produtor tudo organiza. A logística humana e material deve
seguir disciplinados preceitos que parecem os de um
autêntico militar – «tempo é dinheiro» – diz Centeio com a
convicção de quem já a vida lhe deu esta lição. Cada um tem
o seu papel a desempenhar na produção de um filme e o
produtor é o timoneiro desta empreitada. «Devo saber extrair
o melhor de cada um, sou um vampiro de talentos, trato das
questões pragmáticas e financeiras, devo resolver os
problemas quando os há» – enfim, um genuíno comandante de
batalhão.
Neste momento, Centeio está empenhado numa produção de
Bollywood, e na índia tudo é feito em grande escala precisa
de coordenar uma equipa de seiscentas (600) pessoas. Uma
autêntica dor de cabeça para quem tem de marcar estadias,
refeições e prever os mais pequenos detalhes. A vida de
produtor não é fácil, «exige muito trabalho, muita
obstinação, e muito tempo». Certas etapas da produção de um
filme podem levar anos – «cinco anos», refere como exemplo
pessoal – pelo que, embora se deva sonhar, deve-se parcelar
o sonho em etapas menores, senão deparamo-nos com uma
«montanha intransponível». A conclusão de cada etapa é uma
vitória, até à vitória final. O fundamental é a vontade de
trabalhar e a persistência, o resto é consequência desse
trabalho.
O «Conversas com…» Fernando Centeio assim acabou, com esta
mensagem de vida e conselho para os mais jovens, que pronta
e merecidamente aplaudiram o convidado.
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